O mercado do amor...
Tenho saído de casa de manhã bem cedo. Antes das
sete e trinta já estou na rua. Moro numa região residencial com muitos prédios
de apartamentos.
E tenho observado um fato curioso. Muitos moradores
estão nas calçadas passeando com seus cães. São poodles, Lhasa, shihtzu,
pequinês, pinscher e outros tantos nomes que nem sei dizer. E é interessante
observar que por mais pomposas que as pessoas sejam, lá estão elas com as sacolinhas
e pazinhas, juntando coco do chão... Perdoem-me a comparação, mas, será que
fariam isso por seus filhos? E é assustador quantidade de pessoas “conversando”
com os animais, e de “comadres” contando uma a outra as “aventuras” de seus “filhotes”
( e aqui leia-se “filhos pequenos” mesmo).
E estive pensando no que afinal ocasionou essa
"proliferação" de amor canino por parte das pessoas. Carência
afetiva? Falta de companhia? De amor? Tudo, tudo, leva à “solidão” e a falta de
confiança numa relação verdadeiramente “humana”, onde os pares têm o direito de
pensar e discutir a relação.
E, tirando algumas poucas pessoas que tem
verdadeira paixão por animais e a solidão de quem procura companhia, a grande
maioria aderiu a "moda". Hoje encontrei uma pessoa, as sete e meia da
manhã passeando com um pastor alemão de casaco de lã... O cão... não a dona!
Quando foi que os animais começaram a necessitar de roupas? Não resisti à
imagem que me veio a cabeça de cães de trenó vestidos de casado, luvas e botas
de camurça...
E a moda que falo nem se trata de vestir o cão ou
ter um cão para "fazer parte" da sociedade. Falo que a moda agora é:
se não tenho amor, nem posso expressá-lo com outro ser humano, eu o
"compro"! Sim, se é verdade que os cães "fazem parte da
família" e são amados como filhos, é verdade também que foi um amor
adquirido no mercado consumista do novo milênio. E ao gosto e estilo do freguês.
Os setores de medicina veterinária; indústria de
ração; pet shops (verdadeiros "salões de beleza" caninos); e moda
canina (sim!), agradecem. Gasta-se com um cão em média dois salários mínimos
por mês. Imagino que exista a "indústria" que “fabrica” os bichinhos
também. Porque a gente vê poucos cães domésticos procriando. E a infinidade de
raças, das quais nunca ouvimos falar antes, que apareceram por aí? Desconfio
que muitas foram criadas em laboratório...
Saudade do bom e velho "vira-lata". Um
filhote de raça não custa menos que R$ 700. Gastos com ração, veterinário,
banhos, tosas, roupas, etc. e tal, levam
uma família a pensar seriamente se vale a pena ter um cão.
Mas, algumas coisas pesam na balança em favor dos
cães: ainda é mais barato que ter um filho. Você pode escolher a cor, o porte,
o aspecto, a raça, as características físicas, enfim; ele pode até ir pra
escola de adestramento, mas nunca fará faculdade; nunca vai ter uma discussão
com você porque quer ir a balada... E a expectativa média de vida dos cães não
passa de quinze anos, ao final desse tempo pode ser perfeitamente substituído. Você
também pode escolher se ele terá filhos e lhe dará "netos"; pode ser
deixado em um hotel, sem remorsos, quando você viajar; e pode até doá-lo a um
amigo se chegar a conclusão que isso não é pra você... Enfim, o inconveniente
de levantar de madrugada para passear na calçada com um cão e juntar coco, é
bem menor que ter um filho!!
Nada contra se ter animais. Desde os primórdios, os
animais domésticos, como os cães, são companhias excelentes para o ser humano.
Mas acredito que as coisas deveriam continuar sendo "naturais". Cães,
gatos, tartarugas, hamsters... virou objeto de consumo e são comercializados
indiscriminadamente. E atrelado a isso vieram os serviços para dar suporte a
esse consumo. Temos casas de ração, petshops a razão de duas lojas a cada
quarteirão. Encontramos ração, shampoo e sabonete para os animais; nas
prateleiras de todas as pequenas lojas, mesmo na periferia e em comunidades
mais pobres.
Mas, alarmante mesmo, é a quantidade de cães que se
tem encontrado abandonados por aí, feito casaco velho que não se usa mais. Mais
ou menos como acontece quando uma relação acaba. Só que não dá pra pedir a um cão
que “vá cuidar da vida”. E mais alarmante ainda é pensarmos nas crianças que
estão jogadas por aí também, e que custariam bem menos ao bolso que um
cachorro...
Ângela Rocha
OBS.: Não pensem vocês que sou "inimiga" dos bichinhos. Gosto deles, mas, como bichos de "estimação" mesmo.
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